A
ÚLTIMA COCA-COLA NO DESERTO
Para
Portugal, o Mundial da Rússia já é passado. Poucas horas a seguir à desilusão, os
portugueses atentos conseguiram ganhar algum de ânimo, ao saber que, pela
segunda vez consecutiva, este país é o grande triunfador dos World Travel Awards, considerados os
“Óscares” do Turismo. Obteve 36 prémios, entre eles: o Melhor Destino Europeu
(pelo segundo ano consecutivo); Lisboa, como sendo a Melhor Cidade Destino da
Europa e com o Melhor Porto de Cruzeiros (pelo terceiro ano consecutivo); a
Madeira a ser considerada o Melhor Destino Insular; os passadiços do Paiva, na
Serra da Freita, a Melhor Atração de Turismo Aventura… Na mesma ocasião, soube-se
também que Portugal terminou a sua participação nos Jogos do Mediterrâneo – em
que fez a sua estreia, representado em 29 modalidades – e conseguiu três
medalhas de ouro, oito de prata e treze de bronze, atenuando a desilusão do
futebol.
É
certo que o elevado número de turistas que nos visitam fomentam a economia,
contribuindo para que haja uma sensação coletiva agradável de um Portugal que,
decididamente, terá saído da crise, ajudando a superá-la. Parece respirar-se de
outra forma, com mais confiança no futuro. Mas também é certo que este inusitado
afluxo de turistas, particularmente nas grandes metrópoles de Lisboa e Porto, e
ainda mais nos seus centros históricos, estão a causar problemas impensáveis há
pouco anos atrás. São contratos de arrendamento a não ser renovados e os
moradores a ser despejados, para investimento no turismo de habitação ou
requalificação para reinvestimento, e a muita procura a fazer disparar os
preços nas vendas dos imóveis, criando um mercado artificial, com valores
altamente inflacionados, que leva o Banco de Portugal a apertar os critérios
para a concessão de empréstimo para a compra de habitação e para o crédito ao
consumo, que colide contra tanto entusiasmo.
Os
portugueses ainda mais atentos não deixam passar em claro um novo máximo
histórico da nossa dívida pública, preocupante, atingido em maio deste ano;
representa um total de 250.313 milhões de euros, de acordo com dados revelados
pelo Banco de Portugal. Só o setor empresarial do Estado, em 2017, tem uma
dívida de 24.290,7 milhões de euros, segundo o Jornal Económico, sendo que «a
Infraestruturas de Portugal continua a ser a empresa pública mais endividada
(…) com uma dívida de 8.289 milhões [de euros]».
Bem,
talvez se compreenda que os portugueses prefiram saber as novidades no arranque
da época desportiva dos “três grandes”, cada um, à sua maneira, a procurar acumular
pontos antes do apito inicial do jogo. Sabe-se da importância em atribuir
importância a algo, como forma de a promover, em que a imagem positiva daí
resultante dá frutos. Veja-se o caso das finanças portuguesas e do respetivo
ministro – Mário Centeno –, que em virtude do “milagre” conseguido, foi eleito
presidente do Eurogrupo. Até parece que ele era a última bolacha do pacote ou a
última coca-cola no deserto.
Talvez
se compreenda a necessidade de introduzir o marketing
em quase tudo, se entendermos o conceito, segundo Philip Kotler, como a
«ciência e a arte de explorar, criar e entregar valor para satisfazer as
necessidades de um mercado-alvo com lucro. Marketing identifica necessidades e
desejos não realizados». E neste sentido, Portugal tem apostado no Turismo e na
própria imagem no exterior e, no futebol, a SAD do Sporting Clube de Portugal tem
muito trabalho a fazer, principalmente para unir os associados e adeptos,
depois de ver desbaratinado o seu plantel principal. Quanto ao ex-treinador
deste clube, tantas vezes acusado de se achar melhor treinador que qualquer
outro, sempre me pareceu um homem simples, que percebe do negócio, que sabe o
que quer e o que não quer. Deliberadamente, ou não, soube construir a sua imagem
e quando foi “empurrado” para fora de um grande clube, foi logo acolhido por
outro grande clube, e agora por outro, de grandes posses financeiras, na Arábia
Saudita – país em que mais de metade do seu território é deserto. Não sabemos
se os adeptos do Al-Hilal entenderam que Jorge Jesus seria a última coca-cola
no deserto, ou que o próprio pense isso de si mesmo, mas retemos, com alguma
estranheza, o entusiasmo com que foi recebido no aeroporto de Riade.
No
Mundial não fomos além dois oitavos, é uma realidade; mas há realidades só
possíveis no mundo do futebol, como é o caso de dezenas de
muçulmanos a aclamar, em uníssono, o ex-treinador do Sporting Clube de
Portugal: “Jesus! Jesus! Jesus!...”!
© Jorge Nuno (2018)
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