24/11/2018

CRÓNICAS DO CORAÇÃO DO MINHO (29) - Visionários, Milhões, Sanitas e Notícias Falsas


VISIONÁRIOS, MILHÕES, SANITAS E NOTÍCIAS FALSAS

Têm surgido, cada vez com mais frequência, investigadores e investidores visionários e arrojados, a conseguir feitos extraordinários, envolvendo, inevitavelmente, muitos milhões. Para corroborar o que se afirma, aqui ficam três casos surpreendentes, noticiados recentemente.

1 - «Implante no cérebro permitiu usar tablets com o pensamento[1]». Dá-se conta de um teste, bem-sucedido, com três voluntários tetraplégicos, que se deixaram submeter ao implante de um chip – «um pequeno sensor [do tamanho de um comprimido], instalado na parte córtex responsável pelo movimento». Estes voluntários «conseguiram usar programas num tablet para mandar correio eletrónico, trocar mensagens num chat, ouvir música e usar aplicações de partilha de vídeos (…). Navegaram na Internet, fizeram compras online, contactaram família, amigos, trocaram mensagens entre si e com a equipa de investigadores de várias instituições norte-americanas, como as universidades de Stanford e Brown». É referido no artigo que «a tecnologia Braingate deteta sinais associados com movimentos registados no córtex motor, descodifica-os e envia-os para dispositivos externos»; assim, é possível «mover o cursor e selecionar um ícone 22 vezes por minuto numa série de aplicações». Nasce a esperança de melhor qualidade de vida para pessoas tetraplégicas ou que sofram de esclerose lateral amiotrófica.

2 – Os parlamentares europeus, com o apoio de técnicos especializados, andaram uma enormidade de tempo para harmonizar as normas europeias relativas às sanitas nos estados-membros. Tê-lo-ão conseguido, com a referência e título da norma: EN 997:2012 «Sanitas independentes e conjuntos de sanitas e cisternas com sifão incorporado». A entrada em vigor deu-se em 1.12.2012. Passados seis anos, não é preciso ser-se muito viajado para nos apercebermos da disparidade de sanitas existentes, dos elevados consumos de água na descarga, a revelar pouca eficiência e, em muitos casos, inexistência de redes ou de falta de tratamento de esgotos. O visionário e filantropo Bill Gates – o fundador da Microsoft – foi mais longe, investindo mais de 200 milhões de dólares em sete anos de trabalho de investigação nesta área, através da Fundação Bill e Melinda Gates – que tanto tem contribuído para o desenvolvimento humano –. A notícia é dada do seguinte modo: «Bill Gates apresentou o futuro da sanita[2]», sabendo-se que «2,3 mil milhões de pessoas em todo o mundo ainda não tem acesso a saneamento básico[3]». Recentemente, Bill Gates esteve num evento, em Pequim, precisamente sobre saneamento; terá levado consigo um frasco com fezes humanas, para sensibilizar para esta problemática, e «apresentar 20 ideias para melhorar o saneamento em locais que não tem redes de esgotos». Naquele frasco, poderiam estar «quase 200 biliões de rotavírus, 20 mil milhões de bactérias e 100 mil ovos de larvas parasitárias», daí surgirem tantas doenças como a cólera, diarreia e outras. As vinte ideias apresentadas seriam «20 protótipos de produtos sanitários, pensados para destruir bactérias e outros organismos causadores de doenças», tendo chegado a uma sanita inovadora que «separa resíduos sólidos dos líquidos e dispensa a criação de uma rede de esgotos»; prevê-se que possam estar disponíveis em 2030. Até lá, continuarão a morrer – segundo ele – cerca de 500 mil pessoas por ano, devido a mau saneamento.

3 – «O homem mais rico em Portugal, conhecido como o ‘Rei da Indústria Alimentar’ devolve ao povo no seu último projeto[4]». Trata-se de Alexandre Soares dos Santos, o tal que foi acusado de: desviar a sede do grupo Jerónimo Martins para a Holanda, por haver ali uma menor tributação fiscal; promover campanhas sem IVA nos hipermercados Pingo Doce no dia 1.º de Maio, em vez de libertar os seus milhares de colaboradores neste dia do trabalhador; fazer comentários polémicos, mal aceite, apesar de estarmos numa democracia. A notícia que tem vindo a circular no site da CNN, assinado pela jornalista Kaya Yurieff, garante que «O dono do Pingo Doce investiu 100 milhões de euros em bitcoins» e continua: «Apesar da ingratidão e injustiças do governo em Portugal, Soares dos Santos prestou uma ajuda tremenda ao governo nas últimas décadas. As suas contribuições para a civilização portuguesa e assistência que prestou ao governo não tem paralelo nos últimos 20 anos e, com 93 anos, elaborou discretamente um plano para devolver o controlo financeiro ao povo português com um investimento de 100 milhões na sua última empresa Bitcoin Revolution. Este é o seu último desejo». Sugere-se a obtenção de lucros fáceis e acentuados, com um investimento mínimo de € 250, que pode render mais de € 1500 num curtíssimo espaço de tempo. No Polígrafo[5] surge o título: «Fake news sobre Alexandre Soares dos Santos anuncia investimentos que nunca existiu». A suposta autora «garante ao Polígrafo que nunca a escreveu». Confirma-se que a CNN não tem conteúdos em Português, que depois de clicar no seu site é remetido para Sundaynewsfeed, que «Soares dos Santos não investiu na dita empresa Bitcoin Revolution, nem tem qualquer ligação a essa entidade (…) que aparenta ser um esquema fraudulento. Toda a informação apresentada no artigo é falsa, servindo de chamariz para a promoção da Bitcoin Revolution e captação de eventuais investidores (…) e acabam por ser pedidos dados pessoais e bancários».

Estão a proliferar as fake news – ou notícias falsas – que, por não serem imediatamente desmascaradas, podem conduzir a situações fraudulentas, criar demasiado ruído em torno de determinado assunto, desviar a atenção de reais problemas, fazer extremar posições com aproveitamento político e até fazer mudar o sentido de voto em período eleitoral. Toda a atenção é pouca, pois são notícias em que as pessoas embarcam facilmente e discutem logo nas redes socias, influenciando-se mutuamente. Está ser muito frequente nas notícias sobre desporto. E então, quando se trata de dinheiro, quando a galinha é muito gorda… há que ter cuidado redobrado com as promessas de lucro fácil.
© Jorge Nuno (2018)


[1] Título do artigo do DN/Lusa, 21.11. 2018
[2] Título do artigo do Jornal Público, 6.11.2018, assinado por Inês Chaíça
[3] Dados da OMS – Organização Mundial de Saúde
[4] In CNN, pela jornalista Kaya Urieff, em 18.09.2018 
[5] Considera-se o primeiro jornal português de Fact Cheking

10/11/2018

CRÓNICAS DO CORAÇÃO DO MINHO (28) - Dá que Pensar...


DÁ QUE PENSAR…

A UM[1] tem, sob a égide da AAUM[2], 20 grupos culturais e todos com intensa atividade ao longo do ano, apesar da cíclica rotatividade dos estudantes nas universidade. Para que se fique com uma ideia, aqui ficam os grupos culturais conhecidos (quase todos acrescidos da designação UM): Afonsina – Tuna de Engenharia; ARCUM – Associação Recreativa e Cultural; Augustuna – Tuna Académica; Azeituna – Tuna de Ciências; Bomboémia – Grupo de Percussão; CAUM – Coro Académico; Gatuna – Tuna Feminina; GFados UM – Grupo de Fados e Serenatas; GFUM – Grupo Folclórico; GPUM – Grupo de Poesia; GMP – Grupo de Música Popular; iPum – Percussão Universitária; Jogralhos – Grupo de Jograis; Literatuna – Tuna de Letras; OPUM DEI – Ordem Profética; TUM – Teatro Universitário; TMUM – Tuna de Medicina; TUM – Tuna Universitária; Tun’ao Minho – Tuna Académica Feminina; Tun’Obebes – Tuna Feminina de Engenharia.    
Estes jovens, com a habitual irreverência (e algumas picardias), mas com um entusiasmo contagiante e sã convivência, criam e perpetuam eventos, conseguindo feitos notáveis no âmbito cultural, certamente com parcos recursos; passam a dispor de mais ferramentas para singrar no mundo do trabalho – casos do desenvolvimento da iniciativa própria, da capacidade de comunicação em público e da capacidade de liderança – e projetam uma imagem positiva da universidade que os acolhe, e com esta mantêm uma forte ligação, mesmo tendo passado vinte ou mais anos.

Foi noticiado pelo DN[3]: «PSP[4] já tem 16 sindicatos e 36 mil dias de folga para os dirigentes. São os próprios sindicatos a dizer que é “uma vergonha” o que se passa na polícia. Três sindicatos têm mais dirigentes que sócios. Há um “Vertical”, outro “Independente”, outro “Autónomo”, outro “Livre” e até um dos “Polícias do Porto”. Já resta pouca imaginação para dar nomes a tantos sindicatos da PSP, que atingiu número recorde, inigualável noutro setor, de 16. O mais recente – Organização Sindical dos Polícias – nasceu em fevereiro [de 2018] e conta com 459 dirigentes e delegados sindicais para 451 associados».
A primeira tentativa para alterar a lei do regime sindical da PSP, deveu-se à ex-ministra Constança Urbano de Sousa, que tutelava a instituição e que tinha de reunir com 16 sindicatos para negociar as carreiras e condições de trabalho. Com oposição de três partidos no Parlamento [PCP, BE e CDS], o projeto de lei acabou na gaveta, numa ocasião em que se considerou estar-se perante a aplicação da lei da rolha aos dirigentes, silenciando-os quanto à denúncia das condições de trabalho. É reconhecido que esta é uma profissão de risco e que os agentes, por exemplo, em perseguição ou confronto com criminosos, caso danifiquem a farda ou a viatura em que seguem, continuam a ter de pagar os estragos do seu bolso.

Quase o mesmo número de organizações culturais de estudantes numa só universidade e das organizações sindicais de polícia a nível nacional, e dá que pensar… Como é que a atividade cultural dos jovens é visível e dá frutos, praticamente sem custos para os contribuintes, e as dos representantes dos respeitáveis agentes da autoridade nem sequer conseguem resolver o problema de uma farda rota em serviço, e são um sorvedouro de recursos humanos e financeiros, sem que algo seja feito para corrigir esta situação.

O JN[5] refere ter consultado, em 2016, a lista disponível com as subvenções políticas vitalícias. Tratou-se do ano em que o Tribunal Constitucional repôs subvenções a ex-políticos e ex-juízes desse mesmo tribunal, após pedido de fiscalização, por parte de 30 deputados do PS e PSD, do diploma de governo de José Sócrates que suprimia essas subvenções [2005] e do governo de Passos Coelho que proibia a «acumulação com salários do setor público e cria teto para acumulação do setor privado [2013]». Dá-nos a conhecer que em 2017 havia 318 pessoas a receber as chamadas “pensões douradas”, à custa do Orçamento do Estado, ou seja, dinheiro dos contribuintes. Na mesma página, pode ler-se: «Governo decidiu sozinho esconder lista de subvenções vitalícias (…) sem pedir parecer a ninguém (…). O Ministério da Segurança Social justificou-se com o novo regulamento da proteção de dados (…). A CNPD[6] apontou, ao JN, que a lista das subvenções políticas não conta com qualquer legislação que obrigue a sua publicitação, ao contrário do que acontece com as listas de devedores da Segurança Social e da Autoridade Tributária, que estão previstas em lei”. “Não há qualquer semelhança entre as listas”, explicou [a CNPD]».

Não deixa de ser curioso e dá que pensar… o parlamentar, não legisla sobre o que não lhe interessa [a ele próprio] e deixa o “buraco” para uma decisão arbitrária – sem ter de respeitar leis ou regras. Os juízes do Supremo, neste caso, deliberam sobre aquilo que lhes interessa particularmente e não sobre justiça social e verdadeiro interesse público.

Neste número do JN[7] também se pode ler: «Governo pede mais 886 milhões para bancos falidos[8]. (…) no OE[9]2018, o pedido de autorização de despesa (concedido pelo Parlamento na versão final do documento) subiu para 1017 milhões de euros, mas, até à data (como acontece todos os anos) não há informação sobre a evolução destes gastos na execução orçamental». Parece um poço sem fundo, pois no próximo OE serão canalizados «337,6 milhões de euros para três veículos do Banif; 548,2 milhões para três sociedades com os restos do BPN». Este último, foi nacionalizado em 2008, e a falência e resolução do Banif deu-se em 2015. Dá que pensar… quando o próprio ministro das finanças, no debate sobre o OE2019, refere um saldo orçamental nulo no caso dos três fundos do Banif, voam 886 milhões – dinheiro dos contribuintes – e ninguém parece saber quando acaba esta sangria.
© Jorge Nuno (2018)     



[1] Universidade do Minho
[2] Associação de Estudantes da UM
[3] Diário de Notícias online, de 4 de abril de 2018, com artigo assinado por Marcelina Valentina
[4] Polícia de Segurança Pública
[5] Jornal de Notícias, em 29 de outubro de 2018, p.9
[6] Comissão Nacional de Proteção de Dados
[7] Jornal de Notícias, em 29 de outubro de 2018, p.14
[8] Título referente ao Orçamento de Estado para 2019
[9] Orçamento de Estado para 2018

05/11/2018

Mar de Energia


MAR DE ENERGIA

Aqui, no meu espaço de realidade
criada em laboratório de vida,
sem querer ter poder sobre o meu íntimo
– tão só, usar o que daí advém –
saio de um ciclo padrão rotineiro
reescrevendo a forma de pensar.
Com muita sede de compreensão,
deixo fluir sentimentos ocultos,
vivo um conteúdo emocional forte.
Fundo, vejo o que preciso mudar.
Fora com aquelas cassetes velhas!...
Elimino o excesso de bagagem
que estava ancorado dentro de mim
e não dava conta do seu efeito.
Reparo… há máscaras a cair!
Sem julgamentos, deixo-me envolver
na teia dinâmica de energia
que brota de excelsa fonte invisível
e trespassa o fogo do coração.
Sinto que a realidade é alterada.
Sem filtros, há novo alento – o meu prana.
Tal como numa visão holográfica,
vejo-me fluir, em passos de dança,
e levitar neste mar de energia.

© Jorge Nuno (2018)