30/08/2015

A Construção dos Meus Versos

A CONSTRUÇÃO DOS MEUS VERSOS

Envolto em floreado emocional
Ouço os murmúrios da intuição,
Logo é detetada uma alteração
No fluxo sanguíneo cerebral.

A despropósito, uma agitação
De ondas gama no lobo temporal,
Julgada fenómeno irreal,
Traz-me revelação até à mão.
                                                                        
Raciocínio lógico em inação,
Sem factos analíticos adversos,
Faz intuir e leva à criação.
                                                                        
Não importa ser visto entre os dispersos
Se é com esta minha dispersão
Que costumo construir os meus versos.


© Jorge Nuno (2015)

27/08/2015

CRÓNICAS DO FIM DO MUNDO (17) - A Inteligência, os Eleitores e os Burros

A INTELIGÊNCIA, OS ELEITORES E OS BURROS

Partindo do nada, como de costume, logo pairou no ar a ideia de escrever sobre Bragança, pois – por mais estranho que pareça – foi considerada a 3.ª cidade mais inteligente do país, situando-se no Top 4, juntamente com Lisboa, Porto e Oeiras, num estudo independente intitulado “Portuguese Smart Cities Index 2015”, efetuado pela IDC – líder mundial em Market Intelligence.

Da inteligência, por oposição, surge-me de imediato a ideia de escrever sobre burros. Pode-se pensar, e com razão, que os decisores têm dificuldade em agir, em planear e, finalmente, colocar no terreno as condições necessárias à prevenção de incêndios, e pode-se intuir que estou a pensar em “burrice”, por essa falta de estratégia nacional. Na verdade, sabemos que anualmente os incêndios se tornam um flagelo, pondo em risco bens e pessoas, exigindo um enorme esforço humano e financeiro no seu combate, particularmente na época de verão, e que ano após ano vamos assistindo, nem que seja à distância, nos primeiros minutos dos telejornais. Foi com agrado que soube que burros de terras de Miranda do Douro iriam ser usados na prevenção de incêndios florestais, num projeto a cargo da Associação para o Estudo e Proteção de Gado Asinino (AEPGA) e a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), experiência que se vai iniciar em 2016, tal como tem vindo a apresentar resultados positivos o projeto que promove a terapia com burros destinado a crianças com deficiências físicas e mentais, incluindo crianças autistas ou com dificuldades de relacionamento, e também com o envolvimento da AEPGA e da UTAD.

Sinto um aviso sonoro de chegada de correio eletrónico, e interrompo o raciocínio e o início da escrita. Trata-se de uma mensagem, contendo um link, enviado por um amigo jornalista e escritor, por quem nutro uma grande estima, devido ao seu perfil e envolvimento generoso no associativismo e na cultura. Nesse artigo, aborda com incidência o interior do país, apesar de viver no litoral, no distrito de Setúbal. Realça a “alteração do mapa das freguesias”, levando ao fim de imensas sedes de Juntas de Freguesia, com “perda do poder autárquico”, o “fim do programa de apoio para a terceira idade”, o retirar de “Centros de Saúde, Repartições de Finanças, Tribunais, Escolas (…)”, originando um forte retrocesso nas vidas dos cidadãos, deixando no ar uma inquietante preocupação quanto ao défice de esclarecimento e à intenção de voto destes portugueses que vivem no interior, com tendência para favorecer “quem lhes fez tanto mal”.

Vivendo eu no interior, por opção, e conhecendo esta realidade, não posso deixar de concordar com a maioria do conteúdo deste artigo. Acrescento que políticas erradas, ao longo de décadas, acelerou a desertificação do interior e considero que o país, de forma desproporcionada, está mesmo inclinado para o litoral, onde se promove o investimento e se concentram populações. Mas quanto ao sistema eleitoral usado para as legislativas, ao método de Hondt e representatividade na Assembleia da República (AR), ao excessivo número de deputados eleitos, aos elevados gastos nas campanhas eleitorais, ao financiamento dos partidos, aos lobbies instalados, à falta de interesse dos partidos políticos em promoveram “reformas” internas, que apregoam para o Estado, com consequências no bolso do cidadão… em tudo isto, de forma corporativa, defende-se o status quo. Não é inocente, ingrata ou de gente “burra”, “atrasada” ou pouco esclarecida, a opinião generalizada que paira sobre a classe política, com políticos de topo na hierarquia do Estado a ter pontuação negativa, que é como quem diz: vergonhosamente abaixo de zero.

Os portugueses, seja de que região forem, são livres de votar na formação partidária que quiserem, de votarem em branco, ou de não votarem, engrossando a enorme lista de abstencionistas em todo o país, como aconteceu nas últimas eleições para as legislativas, com abstenção de 41,1% (a mais alta de sempre) e nas últimas presidenciais, com 53,37% (também número recorde), a que se juntam mais os votos nulos e em branco, levando a que a atitude dos portugueses fosse associada a “indiferença, laxismo e falta de confiança”, perante o ato eleitoral, a política e os políticos.

Mas se ainda resta a dúvida quanto ao peso pouco expressivo dos eleitores que vivem no interior do país, deixo aqui o número de eleitores e o número de deputados a eleger no próximo ato eleitoral de outubro. Na faixa interior do país, que considerei composta pelos círculos eleitorais de Bragança, Guarda, Castelo Branco, Portalegre e Évora (eliminando Beja, por também ter território no litoral), há um total de 735.141 eleitores inscritos nos cadernos eleitorais, que colocam 16 deputados na AR. No círculo eleitoral de Setúbal há 725.783 eleitores que colocam 18 deputados na AR. Constata-se que os cinco distritos do interior citados têm mais 9.358 eleitores e elegem menos dois deputados que o de Setúbal. Só cinco distritos do litoral – Aveiro, Braga, Lisboa, Porto e Setúbal – elegem 60% dos deputados.

Na hora de votar – e falta cerca de um mês – o esclarecimento é importante, e nem quanto a isso os partidos políticos chegaram a acordo, preferindo fazer debates televisivos prévios, relacionados com os ditos debates que (tudo indica) não se vão realizar. Entretanto, há que deixar os burros fazer o seu trabalho, desde que em prol do bem comum, seja em terras de Miranda ou onde quer que se encontrem. Na hora de votar… há que fazer uso da inteligência, consciente que todas as ações/decisões produzem consequências, e ainda mais, quando se fala de inteligência coletiva, a exigir “reformas” do sistema partidário e firme mudança de atitude.

© Jorge Nuno (2015)

08/08/2015

CRÓNICAS DO FIM DO MUNDO (16) - Família Pimparel: entre judeus, cristãos-novos e cristãos.

FAMÍLIA PIMPAREL
Entre judeus, cristãos-novos e cristãos

Vai-se ouvindo dizer que “podemos escolher os amigos, mas não a família” ou, também, “os amigos são a família que nós escolhemos”. Benditos aqueles que não tendo escolhido a família, têm os familiares como amigos; a vasta família Pimparel é um exemplo disso, entre aqueles que têm oportunidade de se conhecer e privar no dia a dia ou em encontros esporádicos promovidos, ou ainda outros, mais ou menos casuais.

Tantas vezes foi questionado, por membros desta família, a proveniência do nome Pimparel e da própria família, ouvindo-se uns zunzuns, passado de boca em boca pelos mais antigos até ao presente, quase a medo, que se tratava de uma família de origem judaica; a alguns deles, devido à Inquisição, terá sido imposto a “conversão” a cristãos-novos e hoje, passado cerca de 500 anos, há predominância de cristãos. Na verdade, ao tempo do rei D. João III, há o relato de um André Gonçalves Pimparel, que se pode ler num documento preparado por Maria José Ferro Tavares (professora catedrática aposentada), intitulado “Entre religiões e negócios, a sobrevivência” e que, com base num documento da Inquisição de Lisboa (PT-TT-TSO/IL/28/57, fot. 9-10) diz o seguinte: “(…) André Gonçalves Pimparel fora viver para a Turquia onde se fizera judeu e nesta fé morrera. Enquanto fora vivo escrevia cartas aos filhos, aos netos e a outros cristãos-novos que tinham ficado em Miranda do Douro, estimulando-os a perseverarem na fé judaica.

Também um artigo assinado por António Júlio Andrade e Fernanda Guimarães (com livros publicados e tendo como fonte IANTT - Inquisição de Lisboa, processo 2181, de Lopo de Leão) refere André Gonçalves Pimparel como uma “figura mítica do movimento messiânico desencadeado por David Reubini (judeu originário da Índia e aclamado como o Messias prometido (…)” e que depois deste ter caído em desgraça, levou a que o Pimparel – um dos seus principais seguidores – se visse forçado a seguir para a Turquia, por terra, com um dos “seis salvo-condutos emitidos em 21.6.1526 pelo rei D. João III (…). Este Pimparel terá partido para o Golfo (Turquia?) e publicamente regressado ao judaísmo, ele que havia nascido judeu e fora um dos ‘batizados em pé’ ”.
Num documentário preparado por José Rodrigues dos Santos (jornalista e escritor), passado na RTP 2, veem-se algumas incursões deste por terras do nordeste transmontano, particularmente em Carção e Argozelo, assim como pelo Arquivo Distrital de Bragança, em demanda das suas origens, e terá concluído que também tem antepassados, de origem judaica e de apelido Pimparel.

O guarda-redes Beto, jogador da Seleção Nacional de Futebol e atualmente ao serviço do Sevilha, demonstra orgulho neste seu apelido, tal como qualquer dos Pimpareis que se conhece.  

         Sabe-se que, na primeira metade do século XX, vários membros desta família detinham, maioritariamente, pequenas áreas de negócio – caraterística de judeus –. Atualmente, os seus descendentes têm vindo a conseguir cargos de relevo, nas mais variadas profissões em diversas cidades europeias e de outros continentes, embora sem o “estrelato” atribuído a quem aparece frequentemente nos media. Atualmente o nome Pimparel está disseminado por todo o Portugal (com maior quantidade em Trás-os-Montes) e também no estrangeiro, com núcleos familiares conhecidos na Alemanha, Brasil, Canadá, Espanha, Estados Unidos da América, França, Reino Unido, Sérvia, Suíça,…

Membros desta família – alguns sem se conhecerem –, criaram e começaram a fazer circular árvores genealógicas das ramificações que conheciam (por mensagens nas redes sociais), para juntar as várias “peças do puzzle” e obter uma visão mais alargada da extensão da família.

Em boa hora partiu a ideia da realização de um primeiro almoço-convívio, por Ricardo dos Santos Pimparel, que se realizou em Bragança em 15 de agosto de 2014, e juntou cinquenta e dois membros desta família, com muitas crianças que ostentam o Pimparel no seu cartão de cidadão, estreitando laços familiares. O “motor” deste evento, em termos organizativos, foram a Lena Pimparel e a Laura Pimparel, primas afastadas (até fisicamente, em cerca de 400 km) e que até há pouco tempo não se conheciam. Para o mesmo dia e mês, em 2015, está previsto o segundo almoço-convívio, igualmente em Bragança.
Como qualquer outra família, nos imensos núcleos familiares desta, em particular, haverá: venturas e desventuras; alegria e momentos menos bons; solidez de relações e abalos ocasionais. Mas no reencontro sobressai o elo forte da amizade, num carinho comovente, a ultrapassar as meras relações familiares (ou o pretexto dos laços de sangue), fazendo-nos experienciar o verdadeiro sentido da vida – nesta caminhada de luta diária – onde nos deparamos, naturalmente, com o tempero de afinidades, cumplicidades, simplicidade e muita fraternidade, valores inestimáveis a preservar para uma vivência mais suavizada e agradável.

© Jorge Nuno (2015)


(casado com uma Pimparel, tendo dois filhos e dois netos com o mesmo apelido).

01/08/2015

CRÓNICAS DO FIM DO MUNDO (15) - Haja Pedalada!

HAJA PEDALADA!

Portugal aparece na linha da frente dos países europeus, juntamente com a Suécia, Letónia, Finlândia e Áustria, no que toca a energia elétrica produzida por fontes renováveis, amigas do ambiente. Está mesmo a ter um papel importante a nível mundial, como exemplo positivo, devido às políticas de implementação de energias renováveis, permitindo evitar, só em 2014, a emissão de 26 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2), que representaria cerca de 40% do total das emissões de gases de efeito de estufa neste país. Deste modo, deu o seu contributo no combate ao aquecimento global, tendo presente as metas do Protocolo de Quioto e os compromissos políticos e climáticos assumidos, a necessidade interna de reduzir a fatura nacional das importações dos combustíveis fósseis (caso do carvão, petróleo e gás natural, os quais têm muito peso no desequilíbrio da balança comercial com o exterior), e conferir ao país maior independência económica e alguma recuperação económica.

Portugal foi mesmo pioneiro mundial no recurso à “energia das ondas”, fazendo o aproveitamento da energia cinética resultante da movimentação da água do mar, sendo a densidade energética das ondas do mar “10 vezes mais alta do que a energia eólica e 100 vezes mais alta do que a radiação solar”. O primeiro a ser criado – o parque das ondas da Aguçadoura (Póvoa do Varzim) –, tem capacidade para abastecer energia elétrica a 15.000 famílias; o segundo – a cinco milhas da costa, ao largo da praia da Almagreira (Peniche) –, após “testes com grande sucesso”, segundo o presidente executivo da empresa finlandesa AW Energy (que investiu neste projeto), tem exploração comercial prevista a partir de 2016 e poderá abastecer 5.500 famílias. 

A Quercus – Associação Nacional da Conservação da Natureza (uma ONG) e a APREN – Associação Portuguesa de Energias Renováveis, depois de terem analisado dados da REN – Redes Energéticas Nacionais relacionados com a produção de eletricidade nesse mesmo ano, concluíram que “foi o ano mais renovável”, devido ao recorde de produção de eletricidade através destas fontes, “permitindo poupanças de 1.565 milhões de euros: 1.500 milhões na importação de gás natural e carvão e 65 milhões em licenças de emissão de CO2”.

Não esqueçamos que, mesmo assim, os processos que levam à exploração destas energias alternativas também têm custos ambientais e sociais, além de elevados custos de implementação dos projetos, que deveriam ser imputados exclusivamente aos investidores e não aos contribuintes.

Há indicadores oficiais que apontam, em 2014, que “a eletricidade obtida a partir de fontes renováveis foi responsável por 62,7% do total energia elétrica consumida, representando um aumento de 6% em relação ao ano anterior”. Como os portugueses têm tendência para desconfiar e estão sempre de pé atrás… com a curiosidade que me carateriza, fui consultar, aleatoriamente, uma fatura de eletricidade de 2014 (calhou setembro na “rifa”) e verifiquei o seguinte, relacionado com as fontes de energia: só a energia eólica representava 53%, a hídrica 12,6% e outras fontes renováveis 10%, o que totaliza 75,6% – representando, neste mês, ainda mais 12,9% do que os valores oficiais indicados como média anual –, o que me deixou agradado quanto ao aproveitamento deste tipo de energias. Procurei explicações para esta diferença e verifiquei que, em 2014, terá sido um ano: mais húmido (em 27%, face à média de anos anteriores), possibilitando melhor aproveitamento da energia hídrica; mais favorável em termos de vento; em que terá havido um aumento de 31% na capacidade instalada para a obtenção de energia fotovoltaica.

O presidente da APREN, referindo-se a 2014, salientou que “o facto de quase dois terços da eletricidade consumida ser de origem renovável possibilitou estabilizar o preço deste bem".
Se é verdade que, na UE, estamos na linha da frente no que toca ao aproveitamento das energias renováveis, também é verdade que:
1 – Portugal tem a terceira pior prestação (0,7%) no que respeita ao uso de energias provenientes de fontes renováveis nos transportes, só ultrapassado pela Estónia (0,2%) e Espanha (0,4%) e muito aquém do objetivo de 10% para 2020”, segundo dados estatísticos oficiais da UE. [Obs.: Não tenho a pretensão de conhecer, em pormenor, a realidade dos transportes urbanos de todos os concelhos do país, mas agrada-me saber da sensibilidade de alguns autarcas (cujas autarquias assumem a função social de assegurar transporte público aos seus munícipes) levando a uma progressiva substituição da frota, movida a gasóleo, por outra com uso de combustíveis menos onerosos e mais amigos do ambiente, de que se destaca a energia elétrica];
2 – Portugal tem o segundo preço mais caro da eletricidade para utilizadores domésticos (por kwh), a seguir à Alemanha, no conjunto dos 28 países da EU, segundo dados recentes do Eurostat. [Obs.: Dei-me ao cuidado de pegar nessa tal fatura aleatória e verifiquei que nela está refletido um acréscimo de 45,2% sobre o custo do consumo de eletricidade medido, onde surge a contribuição audiovisual, imposto especial sobre consumo de eletricidade, potência contratada, taxa de exploração DGEG e IVA (a 23%), o que fará com que tenhamos a energia mais cara da UE].

À partida, parece um contrassenso termos um dos maiores rácios na utilização das energias renováveis face ao total das fontes de energia e, ao mesmo tempo, o custo mais elevado da eletricidade entre estados-membros da EU, sendo este mais um obstáculo à competitividade e ao desenvolvimento da atividade económica do país.

Até se conseguir um desanuviamento deste constrangimento – que asfixia famílias e empresas –, fica a recente promessa governamental: “1.200 veículos elétricos a ser integrados na frota do Estado, até 2020, de acordo com o programa Eco-Mob” (a partir de agora, mas dependente de fundos para avançar e de quem vier a ganhar as próximas eleições legislativas); criação de parques de estacionamento de bicicletas para funcionários públicos, medida anunciada que já deu aso a ridicularizações do gesto, por parte dos sindicatos, e indignação, por parte de funcionários públicos. Valha-nos as bicicletas disponibilizadas aos munícipes e visitantes, por parte de algumas autarquias, sem custos para o utilizador e com todas as vantagens que isso implica, enquanto o bom tempo o permitir, pois é um saudável transporte alternativo aos veículos motorizados.

Haja pedalada, para inovar e aguentar a caminhada!  
© Jorge Nuno (2015)