ATLETAS
OLÍMPICOS, PARALÍMPICOS E TRAPAÇAS
Em plenos Jogos Olímpicos (JO), antecipo
algo que me toca profundamente: os Jogos Paralímpicos (JP)! Num dos cartazes
dos JP pode ler-se a seguinte mensagem: “Atletas
paralímpicos: A pista é igual, a dedicação é igual. O objetivo é igual. Enfim,
é tudo igual”.
Entendo que este Jogos “especiais” são o
expoente máximo para pessoas com deficiência, seja física ou mental, já que são
a oportunidade de uma vida. Tento imaginar o seu forte empenhamento pessoal, ao
longo de anos, na prática de uma modalidade desportiva, para a qual terão
talento e muita paixão, sempre com a esperança de conseguirem essa oportunidade.
Tento imaginar o estupendo trabalho dos seus mentores e equipas de apoio, para os
fazer sentir pessoas completas, apesar das suas deficiências. Tento imaginar os
sonhos que irão carregar nas malas e que mantêm “vivos” estes atletas
“especiais”. Tento imaginar a sua felicidade e dos seus familiares quando, em
nome de Portugal (ou de outro país natal), recebem as merecidas medalhas.
Portugal participa regularmente nos JP
desde 1984, embora a primeira participação seja de 1972. A cada quatro anos, a
seguir aos JO, os atletas paralímpicos portugueses superam todas as
expetativas, pois tem sido corrente conquistarem uma medalha por cada três
atletas. Bem se pode afirmar que “estamos na elite do desporto para pessoas com
deficiência”. No site do Comité
Paralímpico de Portugal, além de apreciar o bom gosto da capa, que refere a
frase “Igualdade, Inclusão e Excelência Desportiva”, fica-se a saber que
participámos em 9 JP, com 264 atletas e já conquistámos 25 medalhas de ouro, 31
de prata e 25 de bronze. Fica-se também a saber que a distribuição das medalhas
obtidas nas várias modalidades é a seguinte: 51 no atletismo; 24 no boccia; 9
na natação; 2 no ciclismo; 1 no futebol e 1 no ténis de mesa.
Ao fazer esta referência elogiosa à
entrega e feitos desportivos dos atletas portugueses, portadores de deficiência,
é evidente que a mesma será extensiva aos atletas de todo o mundo, nas mesmas
circunstâncias e em igualdade de oportunidades. Daí estranhar, até certo ponto,
que o Comité Paralímpico Russo (CPR) tivesse sido suspenso dos JO do Rio 2016,
provisoriamente e como solução radical, pelo Comité Paralímpico Internacional
(IPC), com base no Relatório McLaren. Este relatório foi elaborado por uma
comissão independente da Agência Mundial Antidoping (WADA) e revela a
existência de “doping organizado” na Federação Russa. O canadiano Richard
Mclaren, responsável do relatório, refere o seguinte: “O Estado russo, através
do ministério dos Desportos e contando com a assistência da polícia secreta
(FSB) organizou, entre finais de agosto de 2011 e agosto de 2015, pelo menos um
sistema que pode designar-se como metodologia de positivos que desaparecem para
proteger os desportistas submetidos ao doping organizado”, fazendo constar que
terão desaparecido 35 amostras no desporto paralímpico entre os anos
mencionados. Deste modo, os atletas paralímpicos russos (na totalidade) ficam
impedidos de participar nestes JP, que se realizam entre 7 e 18 de setembro de
2016.
Tento imaginar como aqueles atletas se
sentirão agora, ao ver cair por terra a possibilidade de participação. Ainda
mais ao saberem que Philip Craven, responsável do IPC, terá referido que “esta
situação não tem a ver com atletas trapaceiros, mas de um sistema estatal que
trapaceia”.
Entretanto, o presidente do CPR, Vladimir
Lukin, não concorda com a decisão, que considera “desumana” e “injusta” [para
os atletas] e disse que vai recorrer para o Tribunal Arbitral do Desporto
(TAS). Ficaremos a aguardar a decisão do TAS…
O cientista Ronald Evans, a desenvolver
atividade no Gene Expression – Laboratory
Genetics, nos EUA, afirmou que há medicamentos específicos [leia-se “drogas
legais”], que “melhoram a circulação sanguínea, melhoram o oxigénio nos
músculos, logo, melhoram a performance”,
para rematar: “se não forem proibidos, os atletas usam-nos”.
Uma das substâncias, considerada agora
dopante, que viria a ser proibida a partir de 1 de janeiro de 2016, é o
Meldonium, que viria a original um controlo positivo e o afastamento da tenista
russa Maria Sharapova, impedindo-a de participar nestes JO. Curioso, no mínimo,
é o facto do cientista Ivars Kalvins – licenciado pela Faculdade de Química da
Universidade da Letónia, membro da Academia de Ciências da Letónia e inventor
do referido “medicamento” – ter assegurado, em abril de 2016, que “os atletas
masculinos tomaram a substância, não como potenciador desportivo, mas para
melhorar o seu desempenho sexual”. Um estudo científico publicado pelo Centro
Nacional para Informação Biotecnológica (NCBI) revela que o Meldonium provoca o
“aumento da resistência dos atletas, o melhoramento na recuperação após os
treinos e funciona como um anti-stress, melhorando ainda as
ativações do sistema nervoso”.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin,
afirmou a uma estação de televisão russa, já depois de rebentar o escândalo,
que este produto “não é uma substância dopante”, mas apenas “mantém em boa
forma o músculo cardíaco, quando este é submetido a grandes esforços”.
Apetece dizer: mas se este ”medicamento” tem
vindo a ser comercializado no mercado negro… certamente, não será apenas para
fins medicinais!
Como seria fácil de prever, nestes JO não
há tréguas, com tanta suspeição e acusação, relacionadas com doping. É o caso
na modalidade de natação, com a nadadora russa, Yulia Efimova. Esta, tem
antecedentes de doping, esteve inicialmente suspensa dos JO Rio 2016 e depois viu
admitida a sua participação. Ao subir ao pódio para receber a medalha de prata,
foi vaiada pelo público e, depois, criticada por vários atletas da modalidade,
com destaque para a vencedora da final de 100 m bruços – a americana Lilly King
– que referiu: “As pessoas que foram apanhadas com doping não deviam fazer
parte dos Jogos”; e algo semelhante disse o mítico nadador Michael Phelps (que
já ganhou 25 medalhas, sendo 21 de ouro).
Também o nadador chinês, Sun Yang, foi
verbalmente atacado por um coro de protestos, após ter ganho a medalha de ouro
nos 200 m livres e prata nos 400 m livres, de que é exemplo a frase do nadador
francês, Camille Lacourt: “Enoja-me ver aldrabões no pódio”.
Outro caso preocupante – e que ainda vai
dar muito que falar – centra-se na modalidade de ginástica artística e na
estratégia usada para que atletas mantenham altura e peso baixíssimos para a
idade. É disso que a China é acusada: forçar para que atletas não
tenham um crescimento normal. Pegando apenas em 4 exemplos, com indicação do
nome, idade, altura e peso de ginastas chinesas que obtiveram a medalha de
bronze, por equipas: Wang Chunsong – 20 anos, 1,40 m e 35 kg; Wang Yan – 16
anos, 1,40 m e 33 kg; Tan Jiaxin – 19 anos, 1,48 m e 36 kg; Yilin Fan – 16
anos, 1,48, 37 kg.
Para ajudar a entender, registo a pesquisa
feita pela Escola de Educação de Educação Física e Esportes, da Universidade de
São Paulo, tendo como elemento de estudo 51 ginastas, ex-atletas de alto
rendimento e respetivos familiares. O estudo revelou que “a grande maioria
alcançou ou superou o potencial de estatura esperado”. O investigador, Raul
Alves Ferreira Filho – que preparou a dissertação de mestrado sobre esta
matéria e foi técnico de ginastas durante 15 anos – disse não haver “ligação
entre a modalidade e problemas de crescimento. O que acontece é que as ginastas
que são mais baixas por uma caraterística própria apresentam um biótipo mais
favorável à execução dos movimentos (…) um físico de menor porte atende melhor
às exigências da biomecânica para fazer alavanca e vencer a inércia.
A China, sabendo disso, tudo fará para
manter a estatura das atletas, mesmo que seja contranatura, e assim conseguir
lugares no pódio.
Trapaça atrás de trapaça, vaias quando soa
o hino na hora de receber medalhas, acérrimas críticas aos prevaricadores por
adversários, estratégias governamentais prejudiciais à saúde e ao
desenvolvimento harmonioso do atleta…
Atletas paralímpicos, ainda vão a tempo. Falta
menos de um mês. Mostrem a vossa garra e a grandeza de competir de forma limpa.
Está na hora de dar o exemplo e fazer acreditar no espírito olímpico!
© Jorge Nuno (2016)
Obs.: Crónica publicada no sábado passado, dia
13-08-2016, na BIRD Magazine.
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