SÓ
FALTOU UM BOCADINHO ASSIM…
Após
19 dias de competição, terminaram os Jogos Olímpicos (JO) no Rio de Janeiro. Estiveram
em disputa 42 modalidades, em 306 provas, que valeram 136 medalhas para atletas
femininas, 161 para atletas masculinos e 9 para mistos. Neles, estiveram
envolvidos os melhores atletas do mundo, de todas as modalidades acreditadas.
Muitas
dúvidas pairavam no ar quanto à capacidade organizadora do Brasil num evento
desta grandeza – tão só, o maior acontecimento desportivo à face da Terra!
Antes da chegada dos atletas à “aldeia olímpica” eram bem visíveis as
preocupações relacionadas com a segurança e com as queixas apresentadas por
algumas delegações. Houve quem aproveitasse a ocasião mediática do evento para,
na cidade de acolhimento, denunciar a insatisfação com políticas internas e com
os gastos exagerados com as infraestruturas dos JO. No final dos mesmos, o presidente
do Comité Olímpico Internacional (COI) disse ter sido um desafio ganho e deu ênfase
ao saldo positivo.
Reconheço
ter vibrado, entusiasticamente, com a cerimónia de abertura, também com algumas
modalidades (para referir apenas, a título de exemplo, a espetacularidade e
perfeição na natação sincronizada e na ginástica rítmica) e com os feitos
desportivos, particularmente, pelos recordes olímpicos e mundiais que foram batidos.
Realço modalidades como: ciclismo (sendo aqui, importante o trabalho de
cientistas, relacionado com o piso, tecnologias e equipamentos, que redunda
numa melhoria da performance e consequente
sucesso desportivo, verificado nos 19 recordes olímpicos batidos); atletismo, com
recordes nas categorias de 400 m, 3000 m obstáculos, 5000 m e 10000 m; natação,
com 24 recordes olímpicos e 7 mundiais, em categorias como 100 m peito, 100 m
costas, 800 m e 400 m livre, 100 m borboleta, 400 m medley e 400x100 m livre…
Senti
um misto de satisfação e tristeza, por ver uma equipa representativa da
autodenominada “Nação de Refugiados”. Satisfação por, em boa hora, o COI ter
aceitado a sugestão de dois publicitários brasileiros, a residir nos EUA, de criar
esta equipa; haver uma bandeira (ainda não reconhecida oficialmente pelo COI,
mas com uma campanha apoiada pela Amnistia Internacional), a qual foi elaborada
e proposta pela síria Yara Said (ela própria uma refugiada, a viver na Holanda),
sendo cor de laranja o fundo da bandeira, com uma risca horizontal preta, que
teve inspiração nos coletes salva-vidas usados por todos aqueles que, em
condições de grande fragilidade, veem necessidade de atravessar o Mediterrâneo
em busca de segurança na Europa; haver um hino, composto pelo sírio Moutaz
Arian (também ele refugiado, a viver na Turquia), que não incluiu uma letra,
propositadamente, por entender que a música, ao ser universal, “não precisa de
ser traduzida”.
Senti
tristeza, por todos os atletas incluídos nesta suposta nação não poderem
representar os seus reais países de origem, em paz e nas mesmas condições dos
demais atletas olímpicos.
Senti
tristeza e preocupação pelo “simples” cruzar de punhos na meta da maratona, gesto
feito pelo atleta etíope Feyisa Lilesa, medalha de prata na prova. Viria, de seguida,
prestar declarações à imprensa, afirmando tratar-se de um protesto contra a
repressão na Etiópia e um “sinal de apoio aos manifestantes do meu país que
foram mortos pelo governo”, para completar: “talvez seja morto quando chegar,
ou então preso”, deixando escapar [nas entrelinhas] que poderia ser mais um
refugiado.
A
delegação portuguesa foi a terceira maior de sempre em JO, sendo a maior de
sempre no setor feminino. Só o facto de merecer o direito de estar nesta
grandiosa competição e representar o país, é uma oportunidade, uma honra e
motivo de orgulho, por ser apenas acessível aos melhores. Depois da recente
vitória de Portugal no Campeonato da Europa de Futebol, os holofotes e a
esperança estava em cerca de uma dezena de atletas portugueses, que têm
revelado um alto rendimento nos últimos anos, medalhados em campeonatos
europeus e mundiais. Em termos de resultados finais da participação portuguesa
no JO, pode afirmar-se que se esperava mais; e pelo seu esforço e dedicação,
bem mereciam. Numa das provas de canoagem, mesmo ao meu lado, ouvi o
comentário: “Eia… só faltou um bocadinho!”. Naquele momento, intimamente, também
foi isso que pensei. Curiosamente, vim a saber que o canoísta João Ribeiro (envolvido
na prova) também disse que “faltou um bocadinho”. Na verdade, bastavam poucos
milésimos de segundo para uma medalha em K2 1000 m.
José
Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico Português, assumiu total
responsabilidade perante os resultados alcançados, que ficaram “aquém das
nossas expetativas”, disse, uma vez que “dos três objetivos [traçados] apenas
um foi cumprido”. Já José Garcia, chefe de missão, disse estar “extremamente
orgulhoso” com a comitiva portuguesa, liderada por ele, e referiu que “o
balanço é positivo”, realçando que esta “foi a melhor prestação de sempre em
termos de resultados nos seis primeiros”, com dezanove atletas no “top 10” e
dez entre os seis melhores.
O
saldo da participação portuguesa, em termos de medalhas, ficou por uma de
bronze, obtida pela Telma Monteiro, em judo, categoria de – 57 kg (cerca de
cinco meses depois de uma lesão, que obrigou a uma operação ao joelho esquerdo,
mostrando que é uma mulher com garra). Também, foram atribuídos dez diplomas
olímpicos aos seguintes atletas portugueses: Emanuel Silva e João Ribeiro, 4.º
lugar em canoagem / K2 1000 m; Fernando Pimenta, 5.º lugar em canoagem / K1
1000 m; Marcos Freitas, 5.º lugar em ténis de mesa; João Pereira, 5.º lugar em
triatlo; equipa composta por Fernando Pimenta, Emanuel Silva, João Ribeiro e
David Fernandes, 6.º lugar em k4 1000 m (batendo o recorde nacional); Ana Cabecinha,
6.º lugar em 20 km marcha; seleção olímpica de futebol; Patrícia Mamona, 6.º
lugar em triplo salto (com recorde nacional, apesar de se sentir prejudicada
pela excitação no estádio, com a atuação simultânea do velocista jamaicano
Usain Bolt), e Nelson Évora, 6.º lugar em triplo salto (apesar das várias
lesões que teve, desde 2012, uma delas com gravidade, que faz deste atleta um
exemplo de tenacidade perante a adversidade); Nelson Oliveira, 7.º lugar em
ciclismo /contrarrelógio.
Como bom compatriota e
amante do desporto, cheguei a pensar na alegria coletiva se retirasse 29,5
segundos à minha esperança de vida, e os pudesse transferir para benefício da performance de um reduzido número de
nossos atletas olímpicos, nas modalidades de canoagem, triatlo e 20 km marcha. Bastaria
meio segundo da minha vida para a prova de Emanuel Silva e João Ribeiro; dois
segundos para a de Fernando Pimenta; sete segundos, para a prova da nossa
equipa de k4; nove segundos para a de João Pereira; e onze segundos para a de
Ana Cabecinha. A ser assim, hoje estaríamos profunda e egoisticamente
orgulhosos dos nossos atletas, por ver Portugal subir no ranking das medalhas olímpicas. O saudoso professor Moniz Pereira,
seguramente, seria um deles, ainda mais se o atletismo se destacasse.
Acredito
que os atletas para obterem alta performance
necessitam de talento, paixão pela modalidade, apoios e muito… muito treino. Com
um pouco mais de apoio oficial, os nossos atletas terão estes ingredientes.
Parece que “só faltou um bocadinho assim…”, mas da minha parte só posso dizer:
Parabéns, atletas olímpicos!
© Jorge Nuno (2016)
Obs.: Crónica saída hoje na BIRD Magazine (criada na UTAD)
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