07/07/2018

CRÓNICAS DO CORAÇÃO DO MINHO (20) - "A Última Coca-Cola no Deserto"


A ÚLTIMA COCA-COLA NO DESERTO

Para Portugal, o Mundial da Rússia já é passado. Poucas horas a seguir à desilusão, os portugueses atentos conseguiram ganhar algum de ânimo, ao saber que, pela segunda vez consecutiva, este país é o grande triunfador dos World Travel Awards, considerados os “Óscares” do Turismo. Obteve 36 prémios, entre eles: o Melhor Destino Europeu (pelo segundo ano consecutivo); Lisboa, como sendo a Melhor Cidade Destino da Europa e com o Melhor Porto de Cruzeiros (pelo terceiro ano consecutivo); a Madeira a ser considerada o Melhor Destino Insular; os passadiços do Paiva, na Serra da Freita, a Melhor Atração de Turismo Aventura… Na mesma ocasião, soube-se também que Portugal terminou a sua participação nos Jogos do Mediterrâneo – em que fez a sua estreia, representado em 29 modalidades – e conseguiu três medalhas de ouro, oito de prata e treze de bronze, atenuando a desilusão do futebol.

É certo que o elevado número de turistas que nos visitam fomentam a economia, contribuindo para que haja uma sensação coletiva agradável de um Portugal que, decididamente, terá saído da crise, ajudando a superá-la. Parece respirar-se de outra forma, com mais confiança no futuro. Mas também é certo que este inusitado afluxo de turistas, particularmente nas grandes metrópoles de Lisboa e Porto, e ainda mais nos seus centros históricos, estão a causar problemas impensáveis há pouco anos atrás. São contratos de arrendamento a não ser renovados e os moradores a ser despejados, para investimento no turismo de habitação ou requalificação para reinvestimento, e a muita procura a fazer disparar os preços nas vendas dos imóveis, criando um mercado artificial, com valores altamente inflacionados, que leva o Banco de Portugal a apertar os critérios para a concessão de empréstimo para a compra de habitação e para o crédito ao consumo, que colide contra tanto entusiasmo.

Os portugueses ainda mais atentos não deixam passar em claro um novo máximo histórico da nossa dívida pública, preocupante, atingido em maio deste ano; representa um total de 250.313 milhões de euros, de acordo com dados revelados pelo Banco de Portugal. Só o setor empresarial do Estado, em 2017, tem uma dívida de 24.290,7 milhões de euros, segundo o Jornal Económico, sendo que «a Infraestruturas de Portugal continua a ser a empresa pública mais endividada (…) com uma dívida de 8.289 milhões [de euros]».

Bem, talvez se compreenda que os portugueses prefiram saber as novidades no arranque da época desportiva dos “três grandes”, cada um, à sua maneira, a procurar acumular pontos antes do apito inicial do jogo. Sabe-se da importância em atribuir importância a algo, como forma de a promover, em que a imagem positiva daí resultante dá frutos. Veja-se o caso das finanças portuguesas e do respetivo ministro – Mário Centeno –, que em virtude do “milagre” conseguido, foi eleito presidente do Eurogrupo. Até parece que ele era a última bolacha do pacote ou a última coca-cola no deserto.

Talvez se compreenda a necessidade de introduzir o marketing em quase tudo, se entendermos o conceito, segundo Philip Kotler, como a «ciência e a arte de explorar, criar e entregar valor para satisfazer as necessidades de um mercado-alvo com lucro. Marketing identifica necessidades e desejos não realizados». E neste sentido, Portugal tem apostado no Turismo e na própria imagem no exterior e, no futebol, a SAD do Sporting Clube de Portugal tem muito trabalho a fazer, principalmente para unir os associados e adeptos, depois de ver desbaratinado o seu plantel principal. Quanto ao ex-treinador deste clube, tantas vezes acusado de se achar melhor treinador que qualquer outro, sempre me pareceu um homem simples, que percebe do negócio, que sabe o que quer e o que não quer. Deliberadamente, ou não, soube construir a sua imagem e quando foi “empurrado” para fora de um grande clube, foi logo acolhido por outro grande clube, e agora por outro, de grandes posses financeiras, na Arábia Saudita – país em que mais de metade do seu território é deserto. Não sabemos se os adeptos do Al-Hilal entenderam que Jorge Jesus seria a última coca-cola no deserto, ou que o próprio pense isso de si mesmo, mas retemos, com alguma estranheza, o entusiasmo com que foi recebido no aeroporto de Riade.

No Mundial não fomos além dois oitavos, é uma realidade; mas há realidades só possíveis no mundo do futebol, como é o caso de dezenas de muçulmanos a aclamar, em uníssono, o ex-treinador do Sporting Clube de Portugal: “Jesus! Jesus! Jesus!...”!

© Jorge Nuno (2018)
               

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